[Crônica] A TRANSFORMAÇÃO PELA CRÔNICA

Tenho dois filhos, o menor está com 9 anos – embora sempre me engano e acho que ele chegou aos 10 anos – e o mais velho está para completar 15, portanto se despedindo dos 14 anos. Para mim, o pai, três destas quatro idades são significativas: os 9, os 14 e os 15. Os 10 também, foram com eles que ganhei uma grande festa no fundo da casa dos meus pais e, olhem só, com filmagens e tudo! Hoje as fitas VHS estão na estante da minha mãe, ainda sem conversão para os meios digitais. Se hoje qualquer celebração – desde os almoços das firmas aos noivados desta vida – no mínimo 15 filmagens são feitas, isso porque todos têm celulares com câmeras, nos anos de 1990 gravar era uma raridade. Que bom que meus pais realizaram aquele registro, pois lá estão imagens do meu avô materno, Miguel Barbosa (1922-1994). Quando criança, fora ele quem me antecipou a minha profissão de fé: revelou que eu seria jornalista. No setembro de 2020 completo jubileu de prata nesta carreira de repórter e redator. São 25 anos de uma jornada à qual sou extremamente grato por motivos maiores: amo o que faço, posso aliar a escrita e a criatividade, encurtar distâncias e servir ao próximo pela comunicação social. Comunicar-se é a primeira necessidade do ser humano e fonte motriz de toda a transformação. Se ainda emitíssemos grunhidos nas sepulcrais cavernas de nossa existência primária, a humanidade há muito tinha desaparecido da face desta Terra.

Quando tinha 9 anos comecei a escrever histórias, pequenas narrativas de aventuras. Naquela mesma época minha mãe, que era professora da rede municipal de Paraguaçu Paulista, reuniu os meus primeiros textos e levou para um dos escritores em atividade naquela cidade, que fica a 80 quilômetros de Marília. Célio Rodrigues Siqueira, cronista e professor, era autor dos melhores textos da Imprensa dominical paraguaçuense. Havia publicado, por aquele período ‘Cinzeiros e Jequitibás’ – reunindo crônicas sendo a crônica-título uma homenagem sólida para sua amada mãe. Semanas depois do professor Célio ler as minhas historinhas, estava na casa de um amigo e seria realizada uma celebração religiosa. A família deste meu colega era presbiteriana e o professor Célio um grande orador da comunidade evangélica. Minha família era católica e ainda eu não havia assimilado o espiritismo à minha fé. Ao final da celebração, que aconteceu na varanda da casa deste amigo, me apresentei ao professor Célio. Ele me olhou e me parabenizou pelos textos. Me incentivou a escrever. Anos depois, quando era repórter do semanário Folha da Estância, tive a satisfação de dividir a redação com o professor Célio. Antes, dividi a redação com outro grande cronista de Paraguaçu Paulista, o professor Osório Lemaire de Morais, avô da minha estimada amiga Gelly. Foi em setembro de 1995, no semanário ‘A Semana’ que iniciei minha carreira jornalística. Outra coincidência: a 1ª entrevista que fiz para um jornal foi a do maestro Cícero Siqueira, filho do professor Célio Rodrigues Siqueira.

A crônica sempre foi um gênero que me fascinou, justamente por agregar a literatura ao texto jornalístico, inclusive na proporção de informação e no tamanho. Iniciei esta crônica lembrando em Lourenço Diaféria, que através de um texto literário e jornalístico resgatou da marginalidade um dos maiores artistas plásticos do Brasil, o pintor naïf (primitivista) Ranchinho. Na Assis, onde também trabalhei como jornalista – fui repórter do Voz da Terra, em 1999 – Ranchinho pintava e percorria as ruas sendo hostilizado. Diaféria narrou sua história e ao projetar seu talento para o Brasil todo, o mundo ganhou – conforme o livro escrito por Oscar D’Ambrósio – o ‘Van Gogh feliz: a vida e a obra do pintor Ranchinho de Assis’ (editora Unesp).

Bom, para fechar as ideias iniciais deste texto, volto às outras duas datas marcantes: os 14, quando comecei a trabalhar e ter uma vida já de adulto, com horário laboral e metas a cumprir, e os 15, quando conheci a mãe dos meus dois filhos e me percebi poeta e, como não seria diferente, sonhador.

Ramon Barbosa Franco, 41, é formado em Comunicação Social habilitação em Jornalismo pela Universidade de Marília (Unimar), autor dos livros ‘Getúlio Vargas, um legado político’, ‘A próxima Colombina’ e ‘Contos do Japim’, e-mail: [email protected]